domingo, 27 de julho de 2014

 



Noite fria...
Mãos geladas, lábios trêmulos, pele pálida... Agasalhos a postos, algo quente para aquecer o corpo - ainda que não aqueça a alma.
No quarto escuro vislumbro apenas as silhuetas de "gentes" que já deveriam ter ido embora... Por que persistem em ficar? O que buscam, a quem buscam? É apenas um quarto, e lá fora é tudo tão maior e oportuno (tendo convencê-las). No entanto, lá permanecem... como espectros barulhentos, observadores insistentes... Posso quase fitá-los e ouvir de seus lábios cerrados, gritos que sussurram canções que eu quero esquecer...
Tento ignorá-los para que eu possa continuar a escrever. Meu peito arde com um fogo invisível e minhas lágrimas não conseguem extingui-lo. A temperatura parece baixar ainda mais e minhas juntas quase doem... Não gosto do cinza do frio, ele é meio triste, assim como aqueles espectros... Prefiro o calor das cores que banem visitantes indesejados de quartos solitários. Minha voz se faz ouvir para pedir que vão embora, não os quero mais... Alguns baixam as frontes envergonhados, uns dão passo atrás, enquanto que outros me encaram, petulantes, como que em desafio... O meu medo não é maior que a minha vontade de vê-los partir e isso me faz aceitar a afronta muda.
Não os quero.
Partam.
Desprezo vocês...
Não os amo mais.
O frio daquela noite parece ainda aquecer o meu coração. Parei de lhes falar. Não quis olhá-los novamente... Meus dedos começam a escrever com velocidade crescente, as letras surgem como anjos protetores, encontro nelas o incentivo que eu precisava. O cachecol cai aos meus pés e quase não percebo minhas mãos esquentarem à medida que escrevo. Meu peito arfa, já não ouço o burburinho, já não noto detalhes de rostos malqueridos, meus lábios formam uma linha de determinação e posso sentir o rubor de minha face ante os meus desejos... as "gentes" estão indo embora, ainda que a contragosto, forçam-se a ir posto que não as olho mais, posto que já não lhes dou as boas vindas com meus olhos assustados.
Agora, o quarto estranhamente vazio me faz perceber os detalhes que eu não quis ver durante tanto tempo: a mobília desgastada, os velhos lençóis, a janela escondida por trás da persiana azul, o tapete indiano desbotado... Tudo pedindo pelo novo. Novo de todas as formas, com as cores que tanto aprecio, com o som que me faz tanto bem...
O frio persiste e lá fora ainda é noite, mas aqui dentro de alguma forma uns raios de sol despontam da empoeirada janela de minha alma.



Simone Galdino
28 de julho/2014, 01:20h

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